O Varejo é rei e continuará Sua Majestade

Artigo oriundo da 4ª edição do IBGC Dialoga debate tendências do setor e orienta conselhos com lições aprendidas na temporada

  • 23/02/2023
  • Cristina Tuna
  • Artigo

Durante a 4ª edição do IBGC Dialoga, o tema Varejo recebeu quatro convidados de referência na área, com diferentes frentes de atuação. Em conjunto, tivemos várias lentes sobre os desafios da governança e das salas de conselho. Os desafios de ofertas diferenciadas, consumidores exigentes, comunicações focadas em comportamento e o canal de venda fígital moldam um cenário desafiador, nunca antes visto no varejo.

Emily Ewell, CEO e co-fundadora da Pantys, a primeira marca de calcinhas absorventes reutilizáveis falou de como o propósito passa a ser um diferencial de compra e mobiliza 60 milhões de interações sociais numa única campanha. O improvável tabu milenar – a menstruação – passa a ser o foco desta startup digital native que advoga pelo meio ambiente e pela inclusão social, o que inclui cuecas absorventes para transgêneros.

Este tema sensível, que move a essência da Pantys, exige posicionamentos contundentes para os stakeholders, um convite à coragem de lançar a campanha de cuecas absorventes para homens trans.

Com Social Enterprise, adota KPI´s que medem diversas entregas em ESG, como a mudança na cadeia de fornecimento de tecidos.  E seu compromisso ambiental convida a decisões sobre a cadeia do negócio, migrando para tecidos antipoluentes, CO2 neutralizados e doação de calcinhas para combate à miserabilidade menstrual. Tudo isso lado a lado com os demonstrativos financeiros.

Sonia Hess, que presidiu a empresa fundada por seus pais – a consagrada marca de moda Dudalina – marcou a importância da gestão humanística. Sem demérito da importância de consultorias e investimentos de grande amplitude, o cuidado com gente pode (e deve) ser simples. Mesmo na indústria do varejo físico, reconhecida pela mão de obra intensiva e pressão por margem. Um belo exemplo é o tradicional apoio a uma colaboradora em sua primeira gravidez oferecido por uma colega mais madura e mãe, dando tranquilidade e amparo na jornada de trabalho até o nascimento do bebê.

Luiz Felipe Barros, vice-presidente corporativo do Mercado Livre, provocou a indústria centenária do varejo sobre a relação com os consumidores, trazendo o conceito do “re-recruiment” e um modelo de negócio emergente, o retail media.  Vamos, um por vez.

A estratégia tradicional de retenção do cliente pode ser revista considerando que o ser humano usufrui de uma cesta possível de marcas para a mesma categoria, um comportamento quase poligâmico. O cliente fiel bate no teto da sua frequência de compra – o tão conhecido heavy- user. Enquanto o consumidor esporádico descortina o maior potencial de receita.

Portanto, o esforço para a tão esperada fidelidade a uma única marca pode ser trocado por um recrutamento e um re-recrutamento, em um ciclo constante. Esta captura baseia-se na disponibilidade física (physical availability); boa variedade e cobertura de produtos, canais e presença nos canais com a disponibilidade mental (mental availability); ver, reconhecer e pensar em uma determinada marca no momento de compra.  O desafio consequente é entender o consumidor em suas preferências de marca e canais, que entrelaça a indústria no varejo, numa relação simbiótica.

Deste ponto temos o retail media, onde o poder dos dados concentrados no Google e no Facebook dá lugar ao poder superior dos dados do varejo, como a Amazon, por exemplo. Afinal de contas, é no varejo com dados integrados que se encontra o consumidor na prateleira.

Não se trata de dados demográficos. Trata-se de comportamento de compra: onde, quando e em que momento. E mais: o que compra inter-categorias. Assim, o varejo detém a informação de que marca pode crescer sobre outra ou ser adicionada ao carrinho por impulso ou necessidade. Numa taxa de conversão sem precedentes pois encontra o consumidor correto propenso a comprar.

O retail media vem para sanar a dor da hiper fragmentação da comunicação, aumento dos custos de mídia e das restrições de propaganda digital advindas da invasão de privacidade. Os dados da venda deste serviço impressionam, inclusive, pelas margens elevadas, uma benção perto do sofrido markup do varejo.  Na China, o retail media representa 40% do investimento em digital. No Brasil, engatinham-se em 3%.

Para as salas de conselho cabe preparar as organizações para se capitalizarem numa nova unidade de negócio, que demanda integração e transformação digital, inclusive na cultura de venda e compra do varejo. Além do compliance e ética na tratativa dos dados frente a captura de sua monetização.

Marcelo Bicudo, CEO da Superunion Brasil, consultoria em branding do grupo WPP, reforçou a importância do retail media e ressignificou a importância do varejo enquanto marca. Ao invés de uma prateleira com boas opções de produtos, o varejo torna-se uma experiência para o consumidor. Torna-se o “produto” que ele compra.

Este tema raramente ganha grande atenção do conselho, sendo tratado na disciplina de marketing. Em seu ponto de vista, à luz das movimentações globais, é importante tratar de propósito, marca e experiência do consumidor como premissa estratégica para perpetuidade do negócio.

A jornada do consumidor no varejo na era pós-tabloide permeia o digital, o acompanhamento real time e personalizado do pedido e curadoria no atendimento na loja. O varejo é complexo, porque envolve o tráfego (chegada do consumidor ao espaço de compra – virtual ou físico), oferta de produtos, atendimento e pós-venda. Sem o entendimento do posicionamento da marca, não há como traçar a estratégia correta do negócio nestas diversas frentes. Nem dinheiro para tratar todas elas.

Resumindo, as lições aprendidas:

● O propósito pode ser um diferencial de vendas. E deve estar nos KPI´s da empresa e na sua interação com os stakeholders. O varejo desde sempre tem natureza transacional pura e simples. Compra e vende.
● O varejo desde sempre depende de gente. Contratar consultorias e montar projetos podem ser deliberados, mas há que se pensar se os pequenos e simples cuidados com o ser humano estão sendo feitos.
● A forma de fazer comunicação muda velozmente e ela é crítica para geração de tráfego na loja. Manter o radar no comportamento do consumidor é letramento básico na discussão de conselho.
● Atenção ao retail media – seu potencial de negócio e as boas regras de governança.
● Varejo não é só presença, produto, preço, promoção. É marca e merece ter sua estratégia validada em conselho.
● Lifelong learning e aprendizado de campo são requisitos obrigatórios para conselheiros do varejo.

Para saber mais sobre a próxima edição do IBGC Dialoga, clique aqui.

Este artigo foi produzido a partir da 4ª edição do IBGC Dialoga que ocorreu no período de agosto a novembro de 2022. A iniciativa se baseia na formação de grupos, a fim de criar espaços de debate entre pares, trazendo temas da governança corporativa em setores específicos. Na temporada, os grupos foram organizados nos setores: Agro, Empresas de Controle Familiar; Energia; Mudanças climáticas; Startups; Terceiro Setor e Varejo.

Sobre a autora: Cristina Tuna, que assina este artigo, foi instrutora especialista do Dialoga Varejo, na edição. A profissional tem 26 anos de experiência como executiva em bens de consumo, varejo e serviços, suportando marcas globais e locais em multinacionais como Unilever, DiverseyLever, SC Johnson, Bristol-Myers Squibb, além de investidas de fundo, como Hopi Hari. É especialista em estratégia, branding e desenvolvimento de negócios sustentáveis, com excelência técnica e paixão verdadeira por construção de marcas e propósito.

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Este artigo é de responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do IBGC.

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