Mulheres representam 11,5% do total de conselheiros no Brasil

Board Index de 2021 trará dados sobre etnia dos membros de conselhos, diz Fernando Carneiro, sócio da Spencer Stuart

  • 18/12/2020
  • Ana Paula Cardoso
  • Bate-papo

Em 2020, o percentual de mulheres em conselhos de administração nas empresas brasileiras foi de 11,5%, mostrou o Spencer Stuart Board Index Brasil deste ano. O avanço, de um ponto percentual em relação ao ano anterior não é motivo a ser comemorado.  “O resultado este ano foi bem decepcionante. Trata-se de um avanço tímido em relação aos percentuais de 2019 (10,5%) e 2018 (9,4%)”, disse Fernando Carneiro, sócio e líder das práticas de conselhos de administração da Spencer Stuart para a América Latina.

Em média, há uma mulher para cada 7,4 homens nos conselhos de administração de empresas brasileiras. Entretanto, apenas 11 mulheres ocupam cargos de presidente ou vice-presidente nos boards das empresas nacionais. Inclusive este ano houve uma redução:  em 2019 havia 12 mulheres ocupando os cargos mais altos nos conselhos. “O que significa que uma mulher saiu do cargo, mas não foi substituída por alguém do mesmo gênero”, comentou Carneiro.

Entre as boas notícias, mais da metade dos Conselhos (109 Conselhos, 57% do total) apresentam pelo menos uma mulher na sua composição, contra 53% no ano anterior. Para o sócio da Spencer Stuart, como não existe políticas de cotas no Brasil, a paridade de gênero e etnia precisa vir por outras vias. “Cabe aos stakeholders, e especialmente aos investidores, a cobrança de que as empresas tenham maior diversidade em conselhos”.

Em entrevista ao Blog do IBGC Carneiro contou ainda que em 2021 o estudo trará dados sobre o número de membros representantes de etnias diversas em conselhos de administração. “Na prática, sabemos que é zero a diversidade étnica. Mas precisamos mostrar esse retrato em dados”, afirmou. Veja a seguir o bate-papo na íntegra. 

IBGC. Em relação pesquisa deste ano, quais os resultados você considera importantes de ressaltar?
Fernando Carneiro.  Em primeiro lugar houve um pequeno progresso em número de mulheres, mas ainda muito pequeno. A gente percebe inclusive uma desaceleração da contratação de mulheres para conselhos no país. Essa subida de 10,5% para 11,5% este ano, considerando titulares e suplentes, foi menos que esperávamos. Por outro a consolidação de número de conselhos com a presença de pelo menos uma mulher teve um avanço que podemos classificar como considerável. Identificamos progresso? Sim. Mas um progresso muito lento. 

Em termos de diversidade de gênero o Brasil ainda está atrás da média do mundial de 23,8% (cerca de 10 pontos percentuais). A que você atribui o fato de ser lento este processo?
Alguns países tomaram mediadas mais forte para aumentar a diversidade, alguns países adotaram política de cotas. Caso da França que hoje tem 43% de mulheres como membros de conselho nas empresas listadas no CAC 40  (índice de referência da bolsa de Valores francesa) E de forma nenhuma isso afetou a qualidade dos conselhos, eu diria que muito pelo contrário. Então essa é uma das razões de estarmos para trás. Aqui cabe aos empresários, aos controladores, aos presidentes de conselhos, ao stakeholders em geral - e principalmente aos investidores - fazerem uma cobrança mais forte.  E terem isso como objetivo mesmo: já que não é obrigatório por lei, que seja uma meta. E o ideal que não fosse somente uma mulher para o conselho, que fossem ao menos duas. Isso para começo de conversa, porque a meta deve ser chegar um dia à igualdade de gênero na composição dos conselhos. 

Quais são, a seu ver, as ações a serem realizadas para aumentar a paridade deste quadro em relação ao gênero?  
O primeiro passo é reconhecer o fato de já estarmos aumentando a conscientização de que existe mulheres muito bem qualificadas, que existem programas excelentes de qualificação para recebê-las nas posições de conselheiras. Depois, é reconhecer que a tendência é de que cada vez mais investidores irão cobrar das empresas essa diversidade.  E não falo somente dos jovens investidores pessoas físicas que têm entrado na B3 e que, certamente, podem fazer uma pressão a esse respeito. Falo de grandes investidores institucionais como Black Rock e Goldman Sachs. Este último recomenda investir em IPOs apenas em companhias que já tenham a presença de mulheres em seus conselhos. 

A França, como você mencionou, é um dos países com maior índice de mulheres em conselho, há a política de cotas. O que pensa sobre adoção de cotas para membros de conselhos? 
Cota é um tema controverso. Pessoalmente apoio cotas há muitos anos. Porque a cota ao menos define uma meta. Leva a empresa a se emprenhar para tentar atingir a meta de maior diversidade e, caso não consiga, precisa explicar os motivos de não ter encontrado mulheres para compor seus conselhos. A cota é uma força. E quando olhamos o Brasil, o resultado este ano foi bastante decepcionantes. Principalmente se pensarmos que em 2016 tínhamos 7,3% de mulheres em conselhos e este ano chegamos a 11,5%. Ou seja, passaram-se quatro anos para subirmos 4,2 pontos percentuais. É muito pouco crescer no ritmo de um ponto percentual todo ano. O número de mulheres chair é outro problema. Este ano até caiu. Nós tínhamos 7,3% em 2019 e esse ano são 6%. Lembrando que nossa mostra são empresas listadas no Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado da B3.  

Um dos temas bastante discutidos dentro da questão social da pauta ASG é também o da diversidade de etnia, de origem socioeconômica. Vocês pretendem fazer esse recorte nas próximas edições? Por qual motivo?
Acho importante começar a olhar outros temas como a diversidade étnica. A parti do ano que vem o nosso Board Index vai acompanhar os dados de diversidade étnica em nosso recorte. O motivo é simples: sabemos na prática que essa diversidade é praticamente zero nos conselhos de administração de empresas brasileiras. Então, esta ausência é um retrato triste da nossa realidade. Mas ele precisa ser mostrado em números. E eu acredito que, a partir daí fica mais fácil mudar. E aí tem que ter um esforço conjunto, tem que haver muitos stakeholders empenhados para mudar essa realidade. E como você falou, a falta diversidade étnica muitas vezes está ligada à diversidade socioeconômica e no Brasil isso vira um problema ainda maior. A falta de representatividade étnica em conselhos é uma situação insustentável e inaceitável. A gente não tem mais tempo de esperar por isso. E nós mediremos isso a partir do ano que vem.

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