“Empresas devem fazer lição de casa antes de IPO”

Para Cristiana Pereira, da ACE Governance, regras do Novo Mercado são alinhadas com governança e não devem ser só checklist

  • 11/12/2020
  • Ana Paula Cardoso
  • Bate-papo

De acordo com dados da B3, historicamente, quase 70% das ofertas iniciais de ações, as IPOs na sigla em inglês, foram de empresas que entraram diretamente no segmento Novo Mercado. Este ano, até o dia 9 de novembro, a Bolsa de Valores brasileira operou 25 ofertas iniciais de ações. E apenas duas empresas não entraram diretamente na listagem, o que representa 99% das IPOs diretamente no Novo Mercado.
 
A qual fator pode ser atribuído essa concentração de IPOs no segmento? Para Cristiana Pereira, sócia da ACE Governance, conselheira de administração e fiscal e coordenadora da comissão do congresso do IBGC, os investidores privilegiam e precificam melhor a empresas que têm boa governança. “E as regras do Novo Mercado resumem as melhores práticas de governança corporativa”, disse.

Em entrevista para o Blog do IBGC Cristiana, fez um alerta: as empresas devem evitar olhar as regras de adesão ao Novo Mercado apenas como um check list para passar no crivo dos reguladores da B3 ou CVM. “É preciso ter um plano de ação para implementar as boas práticas de governança corporativa. os investidores vão cobrar cada item”, lembrou Cristiana.

Veja a seguir p bate-papo na íntegra.

IBGC. Em termos de governança, em que implica uma empresa estar preparada para fazer IPO diretamente no Novo Mercado?
Cristiana Pereira. Porque ela vai para o novo mercado, o novo mercado é um segmento da bolsa e como qualquer segmento é para diferenciar, ou seja, quem vai em determinado segmento precisa cumprir determinadas regras e ter um perfil. Naturalmente os investidores olham e pensam “bem, se a empresa está no Novo Mercado é sinal de que ela está com determinadas características de boas práticas de governança corporativa. O que leva os investidores a privilegiarem e precificarem melhor essas empresas. Então, a gente pode dizer que o Novo Mercado meio que resume as melhores práticas de governança.

As empresas engajam-se mais na adoção de boas práticas de governança porque querem se preparar para a listagem?
Exatamente. O Novo Mercado buscou antes de tudo equilibrar direitos entre os acionistas. Ao longo do tempo, foram sendo agregadas novas camadas de regras. Como a exigência de presença de 20% de conselheiros independentes no conselho de administração, entre outras. E, mais recentemente, foi adicionada uma camada de regras de fiscalização e controle, quando entra a obrigatoriedade do comitê de auditoria 

E como isso afeta na prática a adoção de boas práticas de governança corporativa?
As empresas têm que fazer a lição de casa. Eu acho que existe alguma tensão das empresas entre o fato de ter consciência de que preparar-se para estas regras não é algo trivial. Ter políticas não somente no papel, mas implementadas, dá trabalho. Porque cada política vai formalizar, de certa maneira, algumas condutas dentro da empresa. Ao mesmo tempo, as novas práticas podem introduzir mudanças, pois muitas das empesas que vão abrir capital e entrar no Novo Mercado ainda não têm essas regras exigidas adotadas na prática. 

Por exemplo?
Política de remuneração, por exemplo. Toda empresa tem alguma prática de remuneração. Então, ela vai ter ou formalizar essa prática ou adequá-la para o que é aceitável. Os investidores olham muito para a questão de remuneração. E o trabalho operacional de ter tudo isso funcionando como uma máquina é enorme. Tem também as informações financeiras, que precisam ser divulgadas a cada trimestre e passar pela auditoria. Para essa engrenagem funcionar de forma fluida só se a empresa estiver consolidada em boas práticas de governança. 

E se não adotarem boas práticas de governança?
Em 2007 (ano do chamado boom das IPOs) teve 64 IPOs, mas depois ficamos um tempo longo sem ter IPO, então, do ponto de vista do empresário, ele tem a sensação de que se ele não aproveitar essa janela só terá outra daqui a 10 anos. Algumas empresas vão cuidar somente do lado formal mas a grande questão é o quanto se está preparado dentro de casa. Eu falo para algumas empresas que é justo fazer checklist para passar no crivo dos reguladores da Bolsa e da CVM, mas é preciso ter um plano de ação para implementar de fato, logo no primeiro ano depois da abertura de capital. Porque os investidores vão perceber como isso está implementado e vão cobrar como está sendo tocado cada item da política. 

Como as empresas propensas a fazerem uma IPO podem se preparar antes? 
Eu vi uma evolução grande nos últimos anos. Quantas empresas já tinham conselho antes de abrirem as ofertas? Muitas. Mesmo que não tivessem ainda os conselhos estruturados dentro das regras do Novo Mercado, mas já tinham conselhos até com um independente. Atribuo muito isso ao esforço do IBGC que tem um contingente muito grande de empresas familiares, empresas fechadas. E esse esforço do IBGC de alcançar mais gente, de ser mais inclusivo, de trazer essa consciência para as empresas de que elas precisam se preparar antes. Sobre o conselho de administração, muita empresa percebeu a vantagem de ter um conselho e o adotou. Agora o passo seguinte talvez seja o de concentrar esforços nessa parte de fiscalização e controle. Para ampliar o número de empresas, mesmo fechadas, que adotem comitês de auditoria.

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