Da conformidade ao compromisso: a complexidade do sucesso empresarial

A humanidade vive um momento crítico e o dever da geração atual com a futura é buscar um sistema econômico sustentável

  • 12/04/2021
  • Andriei Beber
  • Artigo

Pai do "conservadorismo moderno"’, o político anglo-irlandês Edmund Burke acreditava na obrigação de uma geração em relação à próxima, em sintonia com a criação de uma sociedade sustentável. A humanidade vive um momento crítico e o dever para com as gerações futuras parece claro: alcançar um sistema econômico sustentável.

Empresas “nascem” para a perpetuidade e, a despeito de numerosas evidências contrárias, cumprem um papel econômico e social. Representam um ambiente onde ocorre a interação dos fatores de produção, mobilizados para produzir bens e serviços destinados à satisfação das necessidades dos indivíduos. Para viabilizar-se economicamente, a empresa deve obter diferença positiva entre os benefícios monetários auferidos na comercialização de seus bens e serviços e os custos incorridos na sua produção.

Lato sensu, em um sistema capitalista, o propósito da atividade empresarial é potencializar a alocação de recursos para criar o máximo valor econômico possível. Com base nesse argumento, em 1970, Milton Friedman propôs: "A responsabilidade social das empresas é aumentar seus lucros". Esta tese, sustentada ao longo dos últimos cinquenta anos, ainda hoje norteia a ação de muitos administradores, os quais concordam que seu dever é a maximização dos lucros e, consequentemente, da riqueza dos acionistas.

Mesmo admitindo que nenhum empreendimento pode ser criado, ou crescer, sem o comprometimento de seus acionistas, esta retórica adiciona um tom de superioridade moral à ideia de que as empresas devem ser dirigidas no interesse exclusivo dos acionistas. Na direção contrária, Colin Mayer, professor da Universidade de Oxford, chega a radicalizar seu entusiasmo ao afirmar que: "O propósito das empresas não é gerar lucros. Seu propósito é produzir soluções rentáveis para os problemas das pessoas e do planeta".

Independentemente de reconhecer a importância da geração de lucros para a sobrevivência das organizações, esta não é uma condição exclusiva. Como não operam em um vácuo ético, espera-se que as empresas também sejam sustentáveis. Não obstante, a aceitação de que a lucratividade é um dos elementos que qualifica o ‘sucesso’ de uma organização, na medida em que acréscimos patrimoniais sustentam a continuidade dos negócios, sucesso empresarial é algo mais complexo. Depende da cultura da organização, sua filosofia, valores, a robustez de sua estratégia, o engajamento de seus colaboradores, a eficiência e a qualidade de seus processos, o respeito ao meio-ambiente e à diversidade, seriedade na relação com fornecedores, consumidores e a sociedade em geral.

O caminho para a sustentabilidade inclui a compreensão das ferramentas e processos que regem o cotidiano da corporação, na análise das oportunidades oferecidas pelo mercado e na escolha daquelas capazes de criar valor.

Lucratividade e sustentabilidade

Não há espaço para antagonismos. Lucratividade e sustentabilidade não são excludentes entre si. Organizações ambidestras, capazes de promover este equilíbrio, ampliam sua eficiência e mitigam as externalidades negativas decorrentes de suas atividades.

Assim, a qualidade da governança corporativa, nesse caso, habilidade de tomar boas e rápidas decisões, é o desenho que mais se mostra adequado para compatibilizar exigências de mercado e necessidades de stakeholders. É a maneira por meio da qual regras, normas e ações são estruturadas, sustentadas, regulamentadas e responsabilizadas. A implementação e a manutenção de boas práticas de governança tornam o processo decisório mais robusto, favorecendo a estratégia, o desempenho, o compliance e a prestação de contas, em um ambiente de monitoramento e avaliação contínuos.

Sem embargo às virtudes atribuídas à governança corporativa, percebe-se que o mero cumprimento de códigos, regulamentos e leis (conformidade), é insuficiente para garantir a prosperidade. Com efeito, as lideranças empresariais, hoje mais que nunca, vivenciam um ambiente de mudança e estão cientes da existência de pressões que podem restringir sua operação. Não por outro motivo, as organizações devem ampliar o conceito de governança para além da conformidade e promover uma ação reflexiva em torno da ética, comprometendo-se com aqueles a quem serve, interage e impacta.

O poeta João Cabral de Melo Neto nos dá bons indícios para a resposta, ao atestar que “nenhum galo sozinho tece uma manhã: ele precisa de outros galos”. Apesar das adversidades, não se pode mais negligenciar (ou menosprezar) o caminho que conduz da conformidade ao compromisso.


Autor:

Andriei Beber é Conselheiro de Administração, Professor dos Programas de Formação Executiva da FGV e Coordenador do Capítulo Santa Catarina do IBGC

Este artigo é de responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do IBGC.

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